chico mazzoni: entrevista e exposição no museu náutico

Escrito por Thiago Pinheiro

Equipe de autores da ArqBahia.

Quem é chico mazzoni?

retrato de chico mazzoni

Chico Mazzoni nasceu em Salvador, Brasil, em 1954, e começou a expor suas pinturas a óleo aos 13 anos em uma mostra coletiva no Gabinete Português de Leitura de Salvador. Enquanto estudava arquitetura, ele continuou trabalhando em artes plásticas e se concentrou em projetar e criar cenários para o teatro. Ao longo do tempo, ele mudou de óleo para desenho com várias técnicas, preferindo pastéis a óleo.

Em 1978, ele ganhou uma bolsa de estudos para estudar Restauração de Monumentos na Universidade de Nápoles, na Itália. Durante seus estudos de pós-graduação, ele participou de uma exposição coletiva em Florença e de uma bienal de arte em Nápoles, onde viveu e estudou por dois anos. Ele aproveitou a oportunidade para visitar importantes museus e exposições de arte na Europa e aperfeiçoar sua técnica de desenho.

Na década de 1980, ele trabalhou em várias áreas de produção criativa, priorizando desenho e design de cenário. Ele projetou o cenário para a ópera “La Traviata” no TCA e participou de concursos de carnaval. Ele também trabalhou como arquiteto, restaurador e designer.

Durante sua carreira, ele realizou várias exposições individuais e coletivas, explorando diferentes técnicas e temas. Atualmente, o artista se concentra principalmente na pintura acrílica em telas de tamanhos pequenos e médios.

Mais do que só mostrar um pouco da exposição e falar dele para vocês, nós preparamos uma entrevista com o Chico Mazzoni pra saber mais sobre ele e entender a jornada desse artista, suas preferências técnicas, seus artistas preferidos e sua opinião sobre a cena artística nacional e baiana.

“O patrício”, Chico Mazzoni, acrílico s/ tela


Gosto de misturar tudo e não tenho cor preferida na pintura, a cor é questão de momento. Qualquer tema, pra mim, é só pretexto para afirmar minha linguagem pictórica, a preferência é momentânea, depois passo pra outro…

— Chico Mazzoni

arqBahia: Boa tarde, Chico! Tudo bem? Começando pelo começo, nos conte como foi que você se envolveu com a prática da arte. Quais foram suas primeiras inspirações e o que o(a) motivou a seguir essa carreira?

Chico Mazzoni: Nas minhas lembranças remotas sempre me pego, como acontece com todas as crianças, desenhando em papel colorido de embrulhar pão. Minha família me estimulou me dando estojos de aquarela para pintar. Os cartões de Natal da família eram feitos por mim. Com tanto estímulo, qual criança não se sentiria um artista desde a tenra infância? Daí foi só seguir adiante. Na hora da faculdade optei pela Arquitetura pois precisava ter uma profissão que me sustentasse. Depois da pós graduação em Restauro, me profissionalizei como artista, fazendo uma exposição individual, a cada 2 anos, mais ou menos e participando das coletivas, quando convidado. Inspiração para fazer arte nunca me faltou!

arqBahia: Falando sobre seu estilo de pintura, como você o descreveria? Há alguma cor, técnica ou tema que seja recorrente em suas obras? E em relação a outros artistas, há alguém que você admira e que tenha sido uma grande inspiração para você?

Chico Mazzoni: Venho sempre procurando afirmar uma certa marca, em arte, que tende sempre para uma figuração contemporânea. Estou sempre “inventando” um novo projeto onde essa característica possa ficar evidente. Gosto da técnica da pintura sobre tela, que começou com a tinta a óleo, depois com a tinta acrílica, usando os pincéis, depois descobri a tinta acrílica dimensional que produz um efeito em baixo relevo. Hoje trabalho com a acrílica, a pinceladas, e com a dimensional que se usa apertando uma bisnaga. Tenho agregado à telas também, recentemente, materiais metálicos descartáveis reciclados. Gosto de misturar tudo e não tenho cor preferida na pintura, a cor é questão de momento. Qualquer tema, pra mim, é só pretexto para afirmar minha linguagem pictórica, a preferência é momentânea, depois passo pra outro…Dos mestres da história da arte, prefiro Caravaggio, dos modernos, adoro Matisse, Gauguin, Egon Schiele, dos abstratos amo Rothko e dos contemporâneos não dispenso Lucien Freud, Francis Bacon e Damien Hirst. Mas há muitos outros tantos que me inspiram.

arqBahia: Explorando um pouco mais sua carreira, já teve a oportunidade de expor seu trabalho em outros países? Se sim, como foi essa experiência e como ela afetou sua arte?

Chico Mazzoni: Sim, já expus meu trabalho, fora do Brasil, em algumas mostras coletivas em Nápoles, Florença, Viena e, mais recentemente, em Londres. A maior parte delas, feita com artistas brasileiros. Ainda muito jovem, em Florença, tive contato com estudantes de crítica de arte que acharam meu trabalho muito clássico. Isso me fez quebrar com esse “classicismo”. Mas o que afeta minha arte, na verdade, são as viagens que faço, independente de exposições. A minha exposição virtual, por exemplo, EXCELSOS EXCESSOS – Reciclagem do Barroco, de 2021, foi toda inspirada na Igreja de São Roque, no Bairro Alto de Lisboa, viagem que ocorreu em 2017.

arqBahia: E falando sobre momentos significativos, qual foi o momento mais marcante em sua carreira como artista? Algum projeto especial ou reconhecimento que tenha feito a diferença para você?

Chico Mazzoni: Acho emocionante quando minha arte toca pessoas simples, pouco instruídas ou muito jovens. Essas pessoas são verdadeiras ao gostar daquilo que estão vendo. Hoje de manhã (dia 03/05), por exemplo, recebi a visita, na minha exposição RETRATO FALADO, de um grupo de alunos, bem pequenos, da Escola Municipal NOVA do Bairro da Paz. O entusiasmo das crianças com a exposição e a curiosidade de me conhecerem, me deixaram muito feliz. Doei certa vez uma gravura para uma comunidade carente. Ela foi leiloada e com o dinheiro eles puderam comprar sacos de cimento para construir uma escola. Isso me deixou muito tocado! A arte tem a força de transformar literalmente a realidade!

arqBahia: Agora, voltando pro Brasil, queria saber mais sobre sua visão da Bahia Há algum evento cultural que você acha que todos deveriam conhecer? Alguma celebração que te encante e inspire?

Chico Mazzoni: A Bahia mítica, a Bahia mágica, é uma inspiração em si, na sua totalidade. A Bahia real já é cheia de problemas. Eu sempre preferi ficar com a mítica e a mágica que está cheia de “lugares” para se conhecer. Esses eventos musicais contemporâneos não me interessam, mas a Bahia já teve uma Bienal de Arte, nos anos sessenta, da maior importância, que tentaram ressuscitar há pouco tempo, sem muito êxito. Tem as festas dos orixás no candomblé, tem a procissão e lavagem do Bonfim, tem a festa de Yemanjá e, claro, tem uns vestígios do carnaval livre, de rua, espontâneo, que ainda valem a pena.

arqBahia: E em relação a lugares inspiradores, há algum local na Bahia que seja particularmente marcante para você? Alguma paisagem ou atmosfera que você tenha retratado em suas obras ou que pretende retratar?

Chico Mazzoni: O frontispício da cidade, aquela imagem totalizante que se vê quando você chega em Salvador pelo mar é a mais marcante pra mim. Me dá uma ideia de que eu posso abraçar minha cidade toda de vez. Já fiz várias representações artísticas deste frontispício. Outro passeio que gosto de fazer, por puro deleite, é dar uma volta na península de Itapagipe e desfrutar cada cantinho desse roteiro mágico. Ele tem o cheiro daquela Bahia mágica e mítica de que falei antes.

arqBahia: Falando sobre o futuro da arte na Bahia, como você o vê? Quais são os desafios e oportunidades para os artistas locais?

Chico Mazzoni: Como de costume são imensos, é um eterno “salve-se quem puder”, em que pesem as parcas iniciativas públicas e privadas de promoção da arte na Bahia. Elas são dispersas, sem sistemática e, às vezes, movidas por interesses distantes da arte. Cada artista precisa meter o cotovelo e ir abrindo o caminho ou se enfiar em alguma panelinha que o proteja…ha ha ha ha ha

arqBahia: Qual é a sua opinião sobre a representação da Bahia na cena artística nacional?

Chico Mazzoni: Muito menor do que já foi nos anos 60/70, quando o reitor Edgar Santos fundou a Universidade Federal da Bahia e mandou buscar o que tinha de melhor, fora da Bahia, para ensinar na universidade. Os artistas daqui, via de regra, ficam por aqui mesmo, eventualmente e episodicamente conseguem fazer alguma coisa fora e depois retornam às suas vidas baianas. Eventualmente conseguimos até vender alguma coisa para alguém de fora, mas o movimento e o mercado de arte do eixo sudeste não abre suas fronteiras para nós. Até os editais de arte nacionais são difíceis de se conseguir fora do eixo…

arqBahia: Há algum artista baiano emergente que você acha que deveríamos ficar de olho?

Chico Mazzoni: Na verdade eu gosto do trabalho de José Ignacio que está expondo ORI DE TUPINAMBÁ, com pinturas e esculturas na Caixa Cultural. Ele já tem um tempo de carreira mas seu trabalho, forte e vigoroso, tem sempre um aroma de frescor e novidade, para mim.

a exposição no museu náutico da bahia

No dia 18 de Abril, Chico Mazzoni inaugurou sua 20ª exposição individual intitulada “Retrato Falado” no Museu Náutico da Bahia. A mostra apresenta 18 pinturas, sendo 12 inéditas, que contam uma narrativa de rostos, formas, almas e afetos. Apesar do tema ser retratos, o projeto vai além da pintura de pessoas, explorando diversas camadas de significado e emoções. A exposição está no local até o dia 21 de Maio, todos os dias, inclusive sábado e domingo, das 9 da manhã até às 18 horas com entrada gratuita.

As pessoas retratadas fazem parte da vida do artista: são amigos, alunos da faculdade onde dá aula, colegas e animais. Chico faz um retrato de modo realista, mas ao mesmo tempo fantasioso, na medida em que atribui um árquetipo a cada, como “Dançarino de Pavana”, “Princesa Egípcia” ou “Cigana”.

sonho de dora chico mazzoni
“O Sonho de Dora”, Chico Mazzoni, acrílico s/ tela

“Estive menos preocupado com a verossimilhança física e mais preocupado com um clima, uma atmosfera, uma característica, um desejo dos meus retratados. O projeto colocou para mim, de início, um desafio: buscar um personagem para cada eleito, acreditando que ele se identificaria com este personagem, ou pelo menos, tentar convencê-lo desta potencialidade. Numa espécie de realismo fantástico, pintei cada um como se fosse o seu próprio alter ego”

Chico Mazzoni em entrevista para a revista “Muita Informação”

A obra exposta de Chico Mazzoni chama atenção não só pela qualidade da imagem: o artista desenvolve um textura especial em cada quadro que faz parte do conjunto da obra. Cada uma das pinturas abaixo têm uma textura que a torna especial, principalmente, para mim, o quadro “O Sonho de Dora”, que está no início desse capítulo. Seu relevo, quando vista a distância, pareceu-me uma espécie de véu ou detalhe em gesso.

Outras telas, sem dúvida, chamam atenção de forma mais direta, como “Uma cigana que leu minha mão”, capa da matéria. Mas não se engane, mesmo nela existem técnicas diferentes que fazem o quadro saltar para mais que duas dimensões.

uma cigana que leu minha mão chico mazzoni
“Uma Cigana que leu minha mão”, Chico Mazzoni, acrílico s/ tela

O quadro que ganhou destaque para mim, entretanto, foi o de título “AI SE EU PUDESSE!”, que foi feita em acrílico e acrílico em baixo-relevo. À distância, a tela já chama atenção por diferenciar-se das outras por ter uma espécie de estilo impressionista. O tema da tela, o Mito de Narciso, que é levado com bom humor através do título, se faz claro logo de cara. Porém ao aproximar-se do quadro é que nos impressionamos.

ai se eu pudesse quadro chico mazzoni
“AI SE EU PUDESSE!”, Chico Mazzoni, acrílico s/ tela

O quadro é feito em uma série de belas e trabalhosas camadas de pintura, que se alternam para formar os efeitos impressionistas de luz e sombra. Com uma simetria de cor, o reflexo na água tem uma composição contrária ao superior: prevalece o verde com pontos amarelos, enquanto no outro prevalece o amarelo sobre o verde. Esse quadro é um daqueles que nos fazem pensar como o artista pensou nessa ideia e como ele fez para visualizar ela antes para atingir o resultado desejado.

detalhe 2 do quadro chico mazzoni ai se eu pudesse
Detalhe do quadro “Ai se eu pudesse!” de Chico Mazzoni (Fotografia: arqBahia)
detalhe do quadro ai se eu pudesse chico mazzoni
Detalhe do quadro “Ai se eu pudesse!” de Chico Mazzoni (Fotografia: arqBahia)

De forma geral, a exposição definitivamente nos deixa com vontade de ver mais obras do artista e saber mais, não à toa fui procurá-lo para escrever essa matéria. A obra de Chico, lembro, não é completa vista só por imagens: é preciso estar perto para ver as texturas de seus quadros. Então não perca a chance de ver a exposição no Museu Náutico.


Ficou interessado?
Lembre-se!
A exposição só vai até o dia 21 de Maio!

Se você quiser dar uma olhada a mais nas obras do Chico de forma virtual, recomendamos acessar o site dele e seguí-lo nas redes sociais, onde você poderá acompanhar e ver suas obras recentes e de outras épocas.

O endereço do site dele é Chico Mazoni (chicomazzoni.art.br) e seu instagram é Chico Mazzoni (@chico_mazzoni) .

Avalie esse post

1 comentário em “chico mazzoni: entrevista e exposição no museu náutico”

Deixe um comentário